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08-01-2003
As cartas que Eanes nunca recebeu
A 5 de Julho de 1980, Ramalho Eanes, então Presidente da República, ouviu as queixas dos alunos da Casa Pia, o «grupo dos 63», a quem a instituição apresentara um ultimato de expulsão.
Depois, Eanes pediu-lhes que escrevessem as queixas e lhas enviassem. Mas tal não foi possível porque, nada amável, um responsável da altura negou-lhes o acesso ao papel e à máquina de escrever.
Perante isso, até guardanapos serviram para relatarem o que lhes ia na alma. Mais de 20 anos depois, o DN teve acesso a todas as «cartas» que Eanes nunca recebeu, dada a forma como foram escritas.
São relatos confrangedores, de jovens sem esperanças profissionais e sem apoios familiares no exterior, sendo vários órfãos.
É impossível ficar indiferente aos relatos, como aquele em que se diz: «Quando entrei na Casa Pia estava convencido que ia ser educado, mas em vez de educado fui deseducado.»
Outro aluno lamenta: «Esta casa dá apoio moral, sim, mas será talvez para lançar marginais e incompetentes.» Também se evoca o «clima de terror» que se vivia, a existência de «alunos que vêem passar a sua data natalícia sem um apontamento caloroso e afectividade».
Outro jovem formulava um desejo: «Eu queria viver como qualquer pessoa sem problemas.» Sobre o vestuário, reproduzindo a grafia usada, escreveu-se: «Agora usa-se a roupa uni-sexo aqui usa-se a roupa uni-estação roupa de Verão serve de Inverno e vice versa.»
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