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30-01-2003
Pedófilos da Casa Pia estão já identificados
Há crianças a ser pagas para avançar com nomes de figuras públicas
Fátima Mariano
A provedora da Casa Pia de Lisboa assumiu, ontem, que ainda há pedófilos a trabalhar na instituição, mas negou a existência de uma rede, como tem vindo a ser veiculado por algumas pessoas.
Catalina Pestana, que ontem de manhã foi ouvida pela comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Liberdades e Garantias, assegurou também que aqueles que abusaram sexualmente dos menores estão já identificados, o que lhe permitiu retirar alguns funcionários de serviços para os quais já "não reuniam condições".
Classificando o ambiente que se vive actualmente no interior da Casa Pia como sendo semelhante ao de "um filme de terror", em que "todos desconfiam uns dos outros", a provedora afirmou, no entanto, estar confiante nos resultados das investigações. "Pelo menos, agora não podem dizer que a investigação não foi mais longe porque não lhes foi facultada a infomação e os testemunhos necessários", ironizou. "Tudo o que os investigadores necessitam, é-lhes de imediato facultado".
Revelou, no entanto, que têm surgido algumas dificuldades no apuramento da verdade pelo facto de algumas crianças estarem a ser aliciadas para avançar com nomes de figuras públicas.
"Neste momento, existe um processo de contra-informação organizado, muito grande", contou Catalina Pestana aos deputados. "A maioria dos meninos não sabe nomes. Conhece apenas as caras, mas há quem lhes esteja a soprar alguns nomes sonantes, com algumas notas pelo meio", acrescentou.
A provedora denunciou ainda a existência de abusos, "eventualmente menos graves e em menor número", contra raparigas, que hoje têm a sua vida organizada e, também por isso, "dificilmente estarão dispostas a falar sobre o assunto".
Planos de segurança
Para evitar que situações como as agora publicamente denunciadas possam repetir-se na Casa Pia de Lisboa, Catalina Pestana decidiu introduzir algumas alterações no modo de funcionamento da instituição, nomeadamente, no que diz respeito ao controlo de quem entra e de quem sai das instalações.
A provedora anunciou ter contratado recentemente dois militares aposentados para conceberem um plano de segurança interna e externa, de modo a que os responsáveis da instituição saibam sempre onde e com quem estão os menores.
"Como é possível que tenha havido crianças desaparecidas durante um fim-de-semana sem que ninguém se tenha preocupado com isso?", questionou, acrescentando que a Casa Pia continuará a ter "as portas abertas, mas não escancaradas".
Admitiu, no entanto, que, mesmo assim, possam existir ainda algumas situações pontuais de abuso de crianças, uma vez que, "em alguns casos, há cumplicidade por parte das famílias" quanto à utilização dos menores por "pessoas com forte perturbação mental".
Catalina Pestana anunciou ainda que pretende alterar os protocolos que a Casa Pia firmou com algumas instituições, nomeadamente, com o Casa Pia Atlético Clube, que deu acolhimento a Carlos Silvino ("Bibi"), mesmo depois de este ter sido compulsivamente reformado, o que lhe permitiu continuar a ter contactos com os menores.
Os grupos parlamentares do CDS/PP e do PSD vão apresentar sete projectos de lei que pretendem alterar a reclassificação e a moldura penal dos crimes de pedofilia. Os dois partidos estiveram reunidos, ontem, com a ministra da Justiça, Celeste Cardona, a quemexplicaram os princípios dos seus projectos.
Ambos estão de acordo no que diz respeito à necessidade de alargar o prazo de prescrição dos crimes de abuso sexual de menores, mas diferem quanto ao limite máximo. Enquanto o PSD defende os 19 anos, o CDS/PP prefere os 25 anos, "altura em que a vítima atinge a auto-determinação económica", explicou Telmo Correia, líder parlamantar dos populares, acrescentando que muitos desses crimes acontecem na família.
O PSD propõe também a incriminação da venda de crianças, o que, até agora, não está previsto em Portugal, e da posse de material de pornografia infantil.
Os dois partidos defendem igualmente o reforço dos meios de prova e de investigação. Nesta matéria, o CDS/PP pretende que os fornecedores de ligações à Internet sejam obrigados a facultar à Polícia Judiciária todos os dados relativos aos proprietários e utilizadores de páginas de pornografia infantil.
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