30-01-2003

Provedora da Casa Pia Fala em "Rede Pedófila" e em "Filme de Terror"

Por RICARDO DIAS FELNER

Intervenção no Parlamento

"Sabia que o que iria encontrar era mau, mas não tão profundamente mau", disse aos deputados Catalina Pestana

A provedora da Casa Pia de Lisboa admitiu, ontem, publicamente, pela primeira vez, a existência de uma rede de pedofilia que actuou dentro daquela instituição.

Numa intervenção, por vezes emocionada, na comissão parlamentar de direitos, liberdades e garantias, Catalina Pestana deixou claro que os abusos sexuais cometidos na instituição não foram praticados esporadicamente, "mas de forma sistemática", durante muitos anos.

A responsável nomeada pelo ministro Bagão Félix, na sequência do escândalo de pedofilia que afectou a Casa Pia, no final do ano passado, mostrou-se chocada e surpreendida com os factos de que tem tomado conhecimento, desde que tomou posse. "Infelizmente, estamos no fim de Janeiro e o ambiente ainda é o de um filme de terror.

Sabia que o que iria encontrar era mau, mas não tão profundamente mau", revelou a provedora, acrescentando que "aquilo que sai debaixo do tapete todos os dias é impressionante". "Alguma coisa muito complicada, ao longo de muito tempo, teve lugar ali", sintetizou.

Antes mesmo de os deputados iniciarem a primeira sessão de perguntas, naquilo que pareceu um desabafo, Catalina Pestana confirmou que ainda existem pedófilos dentro da instituição, embora, neste momento, estejam inactivos.

"A minha percepção é que ainda há pedófilos dentro da Casa Pia, mas não há pedofilia. Estão muitos olhos a olhar lá para dentro e, por isso, as coisas estão contidas", disse.

Sem querer violar o segredo de justiça, a provedora referiu que o grupo de pedófilos ligados à pedofilia na instituição pode ser bem superior "aos dois ou três" que saíram para a praça pública: "Há muitos outros, mas os menores não sabem os seus nomes. Conhecem-lhes as caras. Chamavam-lhes 'senhor doutor' e 'senhor engenheiro'.

" Para esta responsável, serão estas pessoas quem está a tentar manipular as investigações, desviando as atenções para figuras sonantes, que nada têm que ver com o caso. "Há muita areia a ser metida no caminho", acusou.

Traçando um cenário de depressão geral na instituição, a própria provedora assumiu também estar a ser afectada pelo processo, quase exorcista, que tem vivido. "Não sou mulher de muitos cansaços. Mas isto está a ser um bocadinho pesado", confessou, caracterizando o espaço físico da provedoria como uma espécie de "castelo dos fantasmas".

Catalina reforçou, no entanto, a sua vontade em continuar a "ajudar a apurar os responsáveis" pelos crimes. "Enquanto aguentar fisicamente... eu bem gostaria de ser frágil...", afirmou, para concluir, com determinação: "Ninguém, desta vez, vai poder dizer que não foi mais longe porque lhe foi sonegada informação."

A este propósito, a provedora elogiou o trabalho de investigação que está a ser feito no terreno pela Inspecção-Geral da Segurança Social, pela Inspecção-Geral de Saúde, pelo Departamento de Investigação e Acção Penal do Ministério Público e, em particular, pela Polícia Judiciária.

"Temos partilhado tanto sofrimento, durante tantas horas, que acho que vamos ficar amigos", afirmou. "Montaram uma sala para os ouvir que parece o quarto das minhas netas", aduziu, para demonstrar a delicadeza com que os investigadores estão a tratar o problema.

Perguntada, ainda, sobre as declarações de "amnésia" prestadas, há algumas semanas, por responsáveis políticos que tiveram a tutela da Casa Pia no passado, na mesma comissão parlamentar, Catalina disse achar "ser falta de memória a mais" e criticou o "facilitismo demonstrado por toda a gente".

A provedora informou, também, a comissão de que pretende criar um conselho técnico-científico, multidisciplinar, e que dois ex-militares já estão a conceber um plano de segurança para os colégios.

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