04-02-2003

Ex-provedor-adjunto da Casa Pia Estava a Prejudicar Investigação

Por LEONETE BOTELHO

Há pelo menos quatro processos disciplinares em curso na instituição; os dois últimos foram instaurados na semana passada

Manuel José Abrantes, o ex-provedor-adjunto da Casa Pia de Lisboa suspenso preventivamente no passado dia 22, foi afastado de funções porque estava a prejudicar a investigação em curso no âmbito da sindicância decretada à instituição ainda em Novembro.

Além de ser um dos principais suspeitos de gestão danosa na Casa Pia - uma outra vertente da sindicância, menos mediática mas que pode motivar outros processos-crime -, Manuel José Abrantes terá sido referenciado por ex-alunos como estando também envolvido no escândalo de pedofilia.

"A certo momento, percebeu-se que a sua presença na instituição era prejudicial para as investigações", afirmou ao PÚBLICO fonte ligada ao processo, para justificar a sua suspensão preventiva.

Esta, aliás, foi proposta pelo instrutor do processo disciplinar a Abrantes, o qual sugeriu o seu afastamento à provedora Catalina Pestana.

Esta, por sua vez, não decidiu sozinha. Levou a proposta de suspensão directamente ao ministro da Segurança Social e do Trabalho, Bagão Félix, que concordou com a suspensão, decretada há quase duas semanas.

Na passada semana, no mesmo dia (quarta-feira) em que prestou esclarecimentos à Assembleia da República (AR), Catalina Pestana levou a Bagão Félix dois novos processos disciplinares a outros tantos funcionários da instituição, tendo de imediato sido instaurados e nomeados os respectivos instrutores.

É provável que estes dois funcionários sejam os mesmos a que a provedora se referiu no Parlamento, quando disse ainda haver "pedófilos" na Casa Pia, embora já não pedofilia.

Estas investigações têm ainda poucos dias, não havendo ainda qualquer proposta de suspensão. Mas denotam a proximidade entre Bagão Félix e Catalina Pestana, que parece não decidir nada sem consultar o governante.

"O senhor ministro tem toda a confiança política na actual provedora, está em total sintonia com ela e tem dado resposta a tudo", garantiu ao PÚBLICO a adjunta de Bagão Félix, Jacinta Oliveira.

Recorde-se que, na sua intervenção na AR, a provedora sugeriu a criação de um conselho técnico científico para a Casa Pia, o que já foi aceite pelo ministro, e aludiu à necessidade de mais quatro educadores, sobretudo para fazer a vigilância nocturna dos internos. Ontem mesmo, estes pedidos estavam a ser analisados pelo gabinete de Bagão Félix.

Além destes três processos disciplinares mais recentes, há pelo menos um quarto funcionário, na casa dos 50 anos, já suspenso preventivamente em Dezembro por Catalina Pestana, depois de ter havido uma nova denúncia de abusos sexuais e agressões físicas a um aluno da Casa Pia.

Esta queixa foi feita pela mãe de um aluno, hoje maior de idade, que, além de acusar "Bibi" e este outro funcionário de o terem espancado e violado entre os 11 e os 18 anos, terá mesmo afirmado perante as autoridades ter sido obrigado a participar em "orgias sexuais" em casa do diplomata Jorge Ritto.

Neste grupo de processos disciplinares não se inclui o ex-provedor Luís Rebelo, pois este foi demitido de funções e aceite o seu pedido de reforma antecipada, já anterior ao escândalo Casa Pia.

Seja como for, se a sindicância em curso vier a comprovar os sinais evidentes de gestão danosa na instituição ou eventuais ligações aos casos de pedofilia denunciados, Luís Rebelo poderá ser accionado pela instituição, além de poder responder em processo-crime autónomo.